A Violência e o Efeito Coca-Cola
A propaganda da Coca-Cola é tão poderosa que consegue nos fazer associar a sensação de sede com um produto que não mata a sede, pelo contrário, você já ouviu falar que precisamos beber 32 copos de água para limpar nosso organismo dos resíduos de um copo de refrigerante?
E o que isso tem a ver com a viole.ncia?
Se a Comunicação Não-Violenta parte do pressuposto de que os seres humanos, por serem sociais, interdependentes uns dos outros, são instintivamente bons e compassivos, qual seria a explicação para o prazer que sentimos ao nos vingarmos ou vermos alguém se vingando com uso de viole.ncia?
Se você ainda duvida da natureza amorosa e compassiva dos seres humanos, acrescento aqui também as observações de Maturana: nosso organismo é tão complexo e frágil (sem pelos, garras, asas, etc) que só sobrevivemos como espécie porque os primeiros seres humanos desenvolveram laços de cuidado e afeto entre si, para poderem se apoiar mutuamente frente aos desafios que a natureza lhes apresentava, e aqueles que por algum motivo manifestavam comportamentos destrutivos, provavelmente ficaram excluídos do convívio com os demais, perdendo oportunidades de receber proteção e de se reproduzir, então ele argumenta que todos nós carregamos os “genes do amor”.
Marshall argumenta que apesar de nossa natureza ser compassiva, fomos insistentemente treinados, desde nossa mais tenra infância, a associar viole.ncia com prazer, até que nos convencemos disso, da mesma forma que associamos quase que imediatamente a Coca- Cola ao prazer da sensação de matar a sede.
Sim, é importante reconhecer que existe uma propaganda tão poderosa quanto a da Coca-Cola para nos vender a ideia de que viole.ncia é a única forma de se resolver uma situação de tensão e conflito.
Assim, após anos sendo expostos a essa “propaganda” da viole.ncia (por meio de histórias, filmes, noticiários, jogos de vídeo-game, quadrinhos, religieducação familiar e escolar, etc.), quando sentimos raiva é quase impossível a princípio desconectar esse sentimento de uma vontade incontrolável de machucar ou usar nosso poder para prejudicar o outro. E da mesma forma, quando percebemos que alguém está com raiva de nós, o instinto de sobrevivência se arma rapidamente para nos proteger, pois a previsão é que vem chumbo grosso pela frente.
Aprender a desassociar a raiva da viole.ncia, da punição e do prazer da vingança é um caminho longo, mas à medida que você começa a trilhar esse caminho, começa a perceber que é possível sentir raiva sem se deixar dominar pelas imagens de viole.ncia que foram armazenadas durante anos em nosso inconsciente coletivo e encontrar caminhos mais construtivos para se permitir sentir, acolher e expressar a própria raiva e também a acompanhar pessoas em sua expressão de raiva com segurança.
É um vício como o da Coca-Cola mas com disciplina e auto-observação, é possível descobrir caminhos muito mais saudáveis e construtivos de se lidar com a raiva os conflitos.
Marina De Martino
Facilitadora de grupos de Comunicação Não-Violenta e Justiça Restaurativa