Recentemente eu estava dando uma oficina de apresentação da Comunicação Não-Violenta para professores.
Um dos exercícios que propus logo no início, foi fazer, em dupla, um check-in (contar como estávamos nos sentindo no início do encontro) e ao mesmo tempo fazer um exercício de escuta, em que um dos pares fica no papel de ouvinte e ao final faz um resumo do que escutou seu colega contar. Cada pessoa tinha um minuto para contar como estava chegando e depois invertiam-se os papéis.
Para demonstrar o exercício, eu contei para o grupo como tinha sido a minha manhã e solicitei que alguns voluntários fizessem um “resumo” do que eu tinha falado.
Parece um exercício simples, até mesmo bobo, e foi isso que os professores pensaram inicialmente.
Aí um voluntária disse: “ah, é fácil, eu consigo fazer”, começou a fazer o resumo e no meio esqueceu o que eu tinha falado. Foi uma gargalhada geral.
Um outro voluntário se ofereceu: “então você teve uma consulta no médico e depois combinou de encontrar uma amiga na Praça da Sé...” Seguiram-se outras gargalhadas do grupo.
O que eu tinha falado é que eu fui a uma consulta no médico, passei pelo centro cidade para almoçar e inesperadamente, encontrei uma amiga no restaurante. Além disso, não falei em que lugar do centro da cidade eu fui almoçar (tinha sido na Praça da República, e não na Praça da Sé) e o voluntário “completou” a minha fala com a imaginação dele sobre onde, para ele, seria o centro da cidade.
E o mesmo padrão seguiu com mais alguns participantes que se voluntariaram.
É um exemplo muito interessante de como não prestamos atenção ao que o outro nos conta e até mesmo quando prestamos atenção, nossos pensamentos, referências, diálogos internos, interferem na forma e na qualidade do que escutamos, frequentemente causando distorções que em situações graves ou conflitos, geram um escalamento da tensão e bloqueio do diálogo.
No caso dos professores, esse exercício teve ainda um potencial educativo muito interessante sobre didática e empatia: se foi difícil para eles prestarem atenção e recordarem o que ouviram, durante um minuto apenas, como é para o aluno ficar prestando atenção e se recordar posteriormente do que foi dito, em uma dinâmica de escuta passiva, durante 50 minutos de aula? E pior, quando trocam-se as aulas, seguem-se temas completamente sem conexão com a matéria anterior.
Não é fácil se manter atento, quieto, interessado em uma situação assim, essa era inclusive uma reclamação dos professores em relação aos alunos. Fazer esse exercício de "troca de pontos de vista", assumindo a perspectiva do aluno e constatar como é essa experiência, levou a questionamentos e reflexões sobre como adequar a didática para que os alunos possam assumir uma postura mais ativa durante o processo de aprendizagem.
Ouvir com atenção e presença, buscando olhar a situação pela perspectiva do outro, é o que na CNV chamamos de escuta empática, um hábito pouco estimulado em nossa cultura, mas se cultivarmos essa habilidade, nossos diálogos terão cada vez mais profundidade, conexão e qualidade.
Marina De Martino
Mediadora de Diálogos, Facilitadora de Grupos de Comunicação Não-Violenta e Justiça Restaurativa
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